Para diretor da OMC, comunidade jurídica deve ocupar seu papel no comércio internacional

04 de outubro de 2019

Por Luís Indriunas, da Avocar Comunicação

Em palestra na reunião-almoço de setembro, Roberto Azevêdo aponta as mudanças da 4ª revolução industrial e os desafios para o Brasil

“Fico muito contente de ver que o comércio internacional está pautando muitos debates no Brasil”, constatou o diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), o diplomata brasileiro Roberto Azevêdo, durante a tradicional reunião-almoço do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP), realizada em 27 de setembro. Em seu discurso, Azevêdo também lembrou a importância do Direito nessa questão. “O engajamento dos stakeholders é fundamental e a comunidade jurídica deve ocupar seu papel”.

Recentemente, além da reunião-almoço, o IASP promoveu o 7º Seminário de Comércio Internacional em parceria com o Instituto Brasileiro de Estudos de Concorrência, Consumo e Comércio Internaciona (Ibrac).

“O diálogo é necessário para o próprio viver. Mais do que nunca precisamos da persuasão diplomática, de um smartpower para superar tantos desafios e levar o Brasil a campos destacados do comércio internacional como provavelmente se avizinha dado tantos acordos internacionais recentemente firmados”, disse o presidente do IASP, Renato de Mello Jorge Silveira, ao apresentar o convidado.

Azevêdo fez um apanhado dos diversos desafios que as economias mundiais enfrentam com a chamada 4ª Revolução Industrial para uma plateia de especialistas que contou com uma presença significativa de mulheres, como bem destacou o palestrante.

Mais abertura

O diplomata iniciou sua fala destacando o momento atual do Brasil que tende à abertura para o comércio exterior, lembrando que o país sempre teve importância na questão já que está entre as cinco maiores economias mundiais. No entanto, para Azevêdo, se comparado ao seu potencial, o Brasil tem uma pequena participação internacional, com ênfase no agronegócio, na mineração, na celulose e em outras commodities. “A força e o peso específico do País tende a aumentar, inclusive, como polo de atração em escala global”, destacou.

Nesse sentido, as políticas domésticas já iniciadas são consideradas importantes, mas representam apenas uma parte de um todo. “As reformas em andamento são essenciais, mas é preciso envolver também políticas ativas para recolocação de desempregados no mercado de trabalho, melhor qualificação e retreinamento do trabalhador”.

O contexto interno, no entanto, não pode prescindir de uma visão externa, segundo Azêvedo. “O mercado externo tem que parar de ser visto como um mercado circunstancial, um plano B”.

“Para que essa abertura aconteça de maneira sustentável, é fundamental ter em conta as mudanças estruturais que estão acontecendo na economia moderna. A automação, a digitalização e os novos modelos de negócios estão revolucionamento completamente a economia global. Essas novas economias estão transformando completamente a maneira com bens e serviços são trocados, intercambiados”.

4ª Revolução

Azevêdo constata essa mudança a partir de dados facilmente detectáveis. Uma das principais características é a velocidade dos acontecimentos. Se após a invenção do fuso (cilindro de que ajuda na tecelagem) em 1779, foram necessários mais de cem anos para que essa tecnologia chegasse aos países menos avançados. O ritmo atual impressiona. No caso do telefone celular, esse hiato foi de 13 anos. Para internet, apenas seis anos.

Essa realidade traz problemas, sobretudo, na questão do trabalho. Esse ritmo provoca uma mudança completa e empregos e atividades desaparecem de cena rapidamente, através dos ganhos de produtividade das novas tecnologias, que reduzem a mão-de-obra. Assim, o trabalhador tem pouco tempo para se readaptar. Oito em cada 10 empregos na indústria são perdidos devido a ganhos de produtividade.

Se de um lado, há essas perdas; do outro, o setor de serviços pode garantir novas oportunidades. “Essa quarta revolução industrial não vai fazer com os empregos desapareçam. Na verdade, nós vamos criar mais empregos que perder empregos, mas as mudanças estruturais estão aí e os efeitos delas são claros”, conclui Azevêdo.

Em média, o setor de serviço vem crescendo 5,4% ao ano no mundo. A participação dos países em desenvolvimento nos serviços no mercado internacional também aumentou mais de 10 pontos percentuais desde 2005. Dezessete países em desenvolvimento respondem por 25% exportações mundiais de serviços e por 34,4 % das importações. O setor representa 50% do Produto Interno Bruto (PIB) chinês, 55% do indiano e 68% do brasileiro.

Nesse sentido, a OMC tem trabalhado para garantir um comércio justo nesse novo quadro. O relatório anual da OMC a ser divulgado em breve vai discutir o papel dos serviços. A organização também criou um indicador que mede o nível de serviços no mercado internacional. Azevêdo adverte para outro desafio: sem uma estrutura de regulamentação, o risco é que as grandes plataformas se beneficiam às custa dos menores e poderá surgir também políticas governamentais conflitantes. “Uma economia digital fragmentada significa simplesmente custo mais alto e a incerteza para o consumidor e a empresa”.

Nesse sentido, o diretor-geral da OMC tem ainda outros temas no radar para os próximos anos. São eles: como ajudar as pequenas e médias empresas, como facilitar investimentos, como estabelecer disciplinas regulatórias para comércio de serviços e como garantir que o comercio contribua para o empoderamento econômico das mulheres.