“Prudência e sabedoria devem ser as margens de um bom julgador”, diz André Mendonça

Por Avocar Comunicações

O presidente Renato Silveira ressaltou na reunião-almoço com o ministro do STF a missão da advocacia e o papel do IASP, diante dos desafios do Supremo em 2023 

O ministro André Mendonça, do STF (Supremo Tribunal Federal), discorreu sobre os dilemas da Corte para 2023 na reunião-almoço do IASP (Instituto dos Advogados de São Paulo), realizada no dia 24, destacando questões que devem permear o futuro do ordenamento jurídico e ainda os dilemas do julgador entre se manter fiel ao histórico de decisões do Supremo ou se fiar nos contornos da interpretação das leis.

O ministro ressaltou a necessidade da busca pelo equilíbrio e a importância de se ouvir a advocacia. “À luz desses desafios, procurarei correspondê-los atento aos meus limites, tentando ouvir a base de advogados e estar atento ao que acontece na sociedade, tendo noção que prudência e sabedoria devem ser margens de um bom julgador.”

Na abertura do encontro, o presidente Renato de Mello Jorge Silveira destacou que em 40 anos recebendo autoridades em almoço, o IASP se orgulha se de fazer essas reuniões sem distinções ideológicas, estando sempre à disposição para ouvir e aprender.

Sobre o convidado, entre outras qualificações como ex-advogado da União e ministro de Justiça, destacou ligações acadêmicas de proximidade com Mendonça, doutor e professor pela Universidade de Salamanca, onde Silveira também fez estudos e deu aulas. 

Sobre o tema da palestra, o presidente do IASP mencionou que o STF tem diante de si desafios, como a questão dos precatórios, a reforma tributária, o marco civil da internet e a dimensão da autonomia da arbitragem. “Acima de tudo há que se pensar o papel da advocacia, sua participação e sua missão junto à Justiça, e esse é o papel do IASP, ajudar nesta discussão e colaborar com a Justiça.”

Neoconstitucionalismo e positivismo

Mendonça agradeceu ressaltando o privilégio de estar em um plenário tão seleto, diante de um grupo representativo dos melhores advogados de São Paulo e do Brasil para compartilhar parte dos desafios do Supremo em 2023 e nos próximos anos, “temáticas desafiadoras, impactantes para a sociedade como um todo, que busca na última decisão do Supremo a luz da Justiça e todos os predicados que nossa Constituição demanda, a partir de um Judiciário independente como temos no Brasil.”

Na abertura de sua fala, exemplificou o que chamou de neoconstitucionalismo. Para o ministro, não se trata apenas de uma teoria, uma metodologia de interpretação, mas de um fortalecimento da Constituição que nasce em oposição ao positivismo. “Nesse estado constitucional, valores e princípios passam a ser considerados elementos norteadores do Direito como um todo. Essa teoria começa a ganhar uma conotação metodológica de interpretação”.

Segundo o ministro, não é possível regressar a uma sociedade de concepção puramente positivista. “Para dar resposta ao que a sociedade vai clamar no momento, me socorro nos princípios e valores. Mas quais valores? Meus, como julgador? Dos 11 ministros com pré-compreensões do que é bom, certo ou errado? Se for assim, partimos então para tendência ativista e concepções não consolidadas na sociedade.”

O grande desafio dos ministros do Supremo, na opinião de Mendonça, é ter noção das limitações do texto legal e adotar uma atitude autocontida. “Buscar Justiça, mas a partir da lei. O prisma de interpretação são os valores, só que o objeto de interpretação é a lei. O papel que desempenhamos tem limites no texto da Constituição.”

Dilemas

Mendonça tratou também da liberdade de expressão, considerada por ele como sendo hoje a base de grande parte dos debates que envolvem o Jurídico e a sociedade. Citando Rousseau e Montesquieu, afirmou que “os direitos fundamentais existem numa relação que envolve reciprocidade, ou seja, todo direito fundamental tem limites, igualdade tem limites, liberdade tem limites, a vida tem limites, propriedade tem limites. O ponto de discussão hoje é quais são esses limites ou quem estabelece esses limites.”

Dentro dessa perspectiva, citou dois temas em que o Supremo discute liberdade de expressão. Um deles envolve dois recursos extraordinários de repercussão geral que tratam das responsabilidades e atribuições das empresas de aplicativos de internet – a LGPD, nos artigos 19 e 21, traz uma pincelada sobre essa questão. Para o ministro, o Supremo e o Legislativo terão de dizer se essas normas são constitucionais ou  inconstitucionais.

O outro tema em questão estava na sessão no STF que aconteceu no mesmo dia desta reunião almoço, com o recebimento das denúncias sobre 100 condutas correspondentes aos atos antidemocráticos de 8/01. Mendonça afirmou que, nesse grupo, 50 denunciados invadiram prédios públicos e o entorno da Praça dos Três Poderes e 50 manifestantes foram presos no dia seguinte na área do quartel do Exército. “Um grupo agiu com violência e outro estava se manifestando. Situações fáticas distintas. Muito mais simples assumir a situação dos 50 presos em flagrante, mas a dos outros não é necessariamente tão simples.”

O ministro afirmou que “à luz desses desafios, procurarei correspondê-los atento aos meus limites, tentando ouvir a base de advogados e estar atento ao que acontece na sociedade, tendo noção de que prudência e sabedoria devem ser as margens de um bom julgador”.

Ao encerrar sua fala, o ministro recebeu uma placa em sua homenagem das mãos do presidente Renato Silveira, que concluiu o evento afirmando que “o IASP e a advocacia como um todo colocam-se ao lado do Supremo nessa missão. Desafios não faltam e soluções não são fáceis. Contem conosco nesse sentido”.