Seminário IASP/AASP discute impacto e validade da reforma tributária

17 de setembro de 2019

Por Avocar Comunicação

 

Consideradas necessárias, mudanças na tributação são debatidas sob os pontos de vista jurídico e econômico, levando em conta a real eficiência das medidas

 

A necessidade de mudanças urgentes na tributação atual foi o ponto convergente dos debatedores do 2º Seminário sobre a Reforma Tributário, organizado pelo Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP) e Associação dos Advogados de São Paulo (AASP), que aconteceu no dia 13 de setembro na sede do IASP. No entanto, os seus impactos e forma de como fazê-la dividiu os especialistas que participaram do debate.

 

O evento faz parte dos esforços do Instituto para detalhar a reforma que avança no Congresso Nacional. Além da primeira versão do seminário, o IASP promoveu uma reunião-almoço com o economista Everardo Maciel e ouviu detalhadamente a proposta do Projeto de Emenda Constitucional (PEC) 45 em uma reunião do Conselho.

 

“Na realidade, este encontro, a nossa discussão do dia de hoje, é a versão de uma discussão iniciada no início do ano, que tem por objetivo, pensar, refletir e ponderar sobre um dos mais importantes vértices de discussão de reforma legal deste nosso ano”, destacou o presidente do IASP, Renato de Mello Jorge Silveira, na abertura do evento.

 

O presidente da AASP,  Renato José Cury, ressaltou a importância do debate. “Neste momento, o debate faz parte da Democracia, a divergência de opiniões, elas precisam ser colocadas, debatidas e precisamos, a partir daí, apurar esses resultados”.

 

“Com posições e propostas divergentes,  a ideia é trazer a posição e a proposta de cada um para a questão. Parece que há um ponto em comum e que todos estão de acordo que é a necessidade de termos efetivamente uma mudança radical no sistema tributário nacional”, destacou um dos organizadores do evento, o diretor e conselheiro da AASP e membro do IASP, Mário Luiz Oliveira da Costa.

 

Impactos nos serviços

 

Ainda na abertura do seminário, a diretora de Comunicação do IASP, Fabiana Lopes Pinto Santello, que também organizou o seminário, ofereceu uma “apimentada” no debate ao apresentar cenários para cinco diferentes segmentos de serviços que seriam, segundo seus cálculos, impactados com uma majoração de tributos que varia de 40% a 445%.   O impacto sobre os  serviços foi um dos principais temas do seminário.

 

Ao iniciar efetivamente o debate o diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), Bernard Appy, apresentou detalhadamente a proposta da PEC 45 que procura mudar a forma de tributação criando Imposto Sobre Operações de Bens e Serviços (IBS), que uniria o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), Imposto sobre Produção Industrial (IPI), Programa de Integração Social (PIS), Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e Imposto Sobre Serviço (ISS). Para mais detalhes sobre a proposta, clique aqui.

 

O IBS seria, então, o Imposto sobre Valor Agregado (IVA) brasileiro. Segundo o pesquisador, o modelo vem sendo adotado por diversos países ao longo dos últimos 25 anos com bons resultados para a economia. Mais de 170 países adotam o modelo. Entre as características de um bom IVA estariam a base ampla de incidência, regras homogêneas, tributação no destino, desoneração das exportações e dos investimentos, tributação das importações e crédito amplo e ressarcimento ágil de créditos.

 

Appy alertou que o modelo irá impactar em alguns setores, mas que o impacto seria mitigado a partir de diversos fatores como diminuição do custo burocrático, diminuição da insegurança jurídica e o fim de distorções competitivas, que acontecem atualmente com desonerações que apenas prejudicam a livre concorrência.

 

E desafiou os participantes: “As pessoas discutem seletividade, mas nunca vi ninguém que serviço, no Brasil, tem que pagar mais imposto. Queria ver alguém defender a questão por razões distributivas ou de seletividade”.

 

No terceiro painel do seminário, o tema da oneração dos serviços voltou a ser discutido.

 

Tanto a presidente da Comissão de Direito Tributário do IASP, Susy Gomes Hoffmann, quanto Maria Rita Ferragut, integrante da mesma comissão, posicionaram-se a favor da reforma, mas ressaltaram que um aumento da carga tributária para o setor é inevitável e que é fundamental traçar um desenho mais claro das propostas para se ter uma dimensão real desse impacto. 

 

Susy, que é coordenadora regional do programa de especial do Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET), destacou que a implementação da alíquota uniforme, estimada em 25%, para um setor até então sub-onerado, deve fazer subir o preço de serviços essenciais como saúde, educação, entre outros. “Será necessário que a indústria e o comércio também olhem para isso, porque o setor de serviços é fornecedor para toda essa cadeia”, afirmou.

 

Livre docente em Direito Tributário pela Universidade de São Paulo (USP), Maria Rita Ferragut, lembrou que, assim como Appy, que a simplificação do sistema, a redução de obrigações acessórias e de litígios, a eliminação de benefícios fiscais  são questões que devem entrar nessa equação.

 

“É preciso se fazer cálculos que considerem o todo para chegarmos a uma conclusão efetiva se a reforma será terrível para o setor ou se será possível. É uma discussão pequena dizer que hoje o prestador de serviços paga 5% e passará a pagar 25%. Haverá tributação de dividendos? Desoneração da folha? Tudo isso tem que entrar na conta”, concluiu.

 

Insegurança jurídica e efeitos na economia

 

Entre as críticas à PEC 45, o professor Heleno Torres ressaltou que sua preocupação central é a insegurança injurídica, já que o projeto prevê 10 anos para ser implantado. Para o jurista, reformas induzem a litígios. 

 

Assim, na sua proposta seria implantar reformas infraconstitucionais que mudariam o sistema. “O ideal seria aproximar os tributos e daí sim migrar para o modelo”. Nessa linha de raciocínio, Torres sugere a simplificação imediata, reduzindo as obrigações acessórias e outras burocracias, a revisão da legislação dos tributos para aplicar os princípios da praticabilidade, eficiência, espontaneidade do pagamento e definitividade, além de promover uma “força tarefa” entre os entes federais para responder consultas, agilizar as compensações e  adotar conciliação ou outro meio para dar solução aos litígios.

 

Na mesma linha, o advogado tributarista Pedro Lunardelli salientou as causas da chamada complexidade do sistema tributário brasileiro. “Órgãos que não se coordenam, tribunais que não respeitam as decisões desses órgãos, tribunais administrativos que não respeitam as decisões desses tribunais; tribunais judiciais que demoram 20 ou 30 anos para estabelecer um conceito tributário”.

 

No seu ponto de vista com o IBS, haverá um aumento de preço que pode não ser aceito pelo cliente, que evitaria comprar. “Assim, o imposto sobre o consumo, se tornará imposto sobre patrimônio”. Além disso, o tempo de 10 anos para implantação efetiva do imposto fará com que o Brasil tenha no período quatro regimes não cumulativos, acarretando também dúvidas sobre quem fará a cobrança judicial, se os municípios, os estados ou a União.

 

Por fim, Lunardelli sugere uma mudança no prazo para atuação do Fisco que hoje é de cinco anos. “É praticamente o tempo de existência de uma empresa”, destacou, lembrando que esse período foi estabelecido em 1964, quando as fiscalizações eram longas, o que não acontece mais graças à informatização do sistema.

 

Já o economista Márcio Holland de Brito defendeu “uma reforma tributária que reduza o peso da carga tributária sobre consumo e aumente a carga tributária sobre renda e patrimônio”, o que não faz parte dos objetivos da PEC 45.

 

Além disso, as mudanças sugeridas, no seu ponto de vista, terão efeito negativo imediato. “As medidas aumentarão a competividade e a capacidade do Brasil crescer no longo prazo, mas, no curto prazo, elas tendem a ser contracionistas”.

 

O economista jogou o desafio: “É possível ter uma reforma mais faseada por etapas?”

 

Outros pontos

 

Ao abrir o último painel do dia, o professor Paulo Barreto destacou que vivemos um momento não mais de nos posicionarmos contra ou a favor da reforma, mas sim de discutir os projetos já apresentados e de buscar a melhor solução tributária para o Brasil. Um dos aspectos que ele apontou como relevante, porém pouco debatido, é a premissa de que a arrecadação tributária deve ser mantida. Segundo o professor, pensar em uma transição que possa levar à diminuição do gasto público e, consequentemente, da arrecadação tributária, é importante para conquistar o apoio dos brasileiros à reforma.

 

O professor fez também uma análise dos desafios do IBS e da tributação dos serviços com relação à alíquota única e à cumulatividade e avaliou que é preciso observar os insumos no setor de serviços. “A alíquota única tende a alterar fortemente os preços relativos”, ponderou.

 

Eurico Diniz di Santi, o segundo palestrante do último painel, enfatizou que a proposta do IVA tem sido discutida com diversos setores da economia e que o objetivo maior da reforma e da PEC 45/2019  é unificar o sistema e criar a cidadania fiscal, empoderando a população para discutir a carga tributária, sem diferenças entre produtos.

 

Ele ressaltou a complexidade do atual sistema tributário brasileiro e que é preciso tirar as empresas do debate de tributação sobre consumo. “O debate da tributação sobre o consumo não é problema das empresas. Elas não pagam INSS, PIS, COFINS. Para garantir isso existe o princípio da não cumulatividade. A premissa fundamental é essa. Assim é criado um ambiente de negócios. A empresa tem obrigação para oferecer nota fiscal eletrônica, apenas isso. Quem faz apuração não é mais o contribuinte, mas sim o Fisco. A função do Comitê Gestor deste novo modelo proposto é para gerir de maneira igualitária a arrecadação e a distribuição entre os entes União, Estado e Município. Autos de inflação, regulamentação e fiscalização são do Comitê Gestor”, explicou Santi.  

 

Por fim, o superintendente da 8ª Região Fiscal (Receita Federal em São Paulo), Giovanni Christian Nunes Campos, fez uma comparação entre o sistema tributário americano, baseado na tributação sobre renda, e o sistema tributário europeu, na tributação sobre consumo, e avaliou que não há um sistema perfeito, que possa ser considerado o melhor do mundo, uma vez que é necessário considerar as peculiaridades de cada Estado. Ele destacou que, apesar do consenso de que o sistema tributário brasileiro é ruim, não se pode deixar de considerar que é responsável por financiar serviços públicos importantes.

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